quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Presente amargo


Esses dias, enquanto devaneava sobre romance com o Fulano, levantei a teoria de Gikovate sobre o amor, que no momento era a que eu mais estava aceitando. Segundo o psicólogo, o amor é a necessidade que sentimos de reencontrar o conforto intrauterino que perdemos no momento do nascimento. Somos gerados dentro de um espaço confortável cercado de afeto e, nove meses depois, somos cuspidos sem explicação, tendo que encarar toda a frieza do mundo. Um mundo hostil, pré-programado pra nos ferir por natureza. Nasce dentro de nós o vazio de encarar essa frieza, e sobra nossa esperança de reencontrar em alguém aquele conforto. O conforto intrauterino pode ser nosso lugar ao sol, pois é um porto seguro que preenche nosso vazio. Naquele instante, eu estava convicto de que encontrara finalmente o preenchimento do meu vazio. Acabara de reencontrar o rapaz que anos antes tinha sonhado em reencontrar, como a realização de um sonho distante. A química era evidente e todos os sinais apontavam para um romance.

Afinal, quão raro no mundo gay é encontrar alguém capaz de preencher esse vazio? Alguém cujos passeios aconteciam naturalmente, caminhando por São Paulo, tirando fotos e conhecendo lugares novos. Kevin preenchia minha necessidade de ver o mundo. Com ele viajei para a baixada, a minha primeira viagem com um homem e sem a companhia de familiares. O menino virando homem. Eu sou um aventureiro por natureza, e uma das minhas maiores crises é não ter quem acompanhe meu ritmo. Gosto de explorar, de sair sem definir o objetivo de vez em quando, mas tenho grande problema com a solidão. Queria ser capaz de abraçá-la, mas ai vem aquele vazio.

Enfim, acho que a pessoa ideal para nós é a que preenche esse vazio. E às vezes buscamos tão desesperadamente por algo que nos salve dele, que confundimos manifestações de afeto simples com algo mais. Acho que foi isso que se sucedeu com Kevin. Eu engrandeci sua imagem baseando-se no grau de importância que achava que ele tinha por ele ter comigo uma história de tempos atrás. E olha que a pessoa era problemática, e eu, em minha necessidade de preencher o vazio apenas abracei todos os seus problemas e tentei me acostumar.

Claro que o resultado seria desastroso, como poderia se prever.

Acontece que a pessoa começou a me tratar mal quando eu disse que nos tornávamos amiguinhos de internet. Simplesmente desapareceu. E eu fui ficando cada vez mais nervoso com a situação. levantei na minha cabeça várias teorias: Está fazendo isso por que quer me afastar e poupar sofrimento de ambos? Eu cometi alguma falha? Seria ele mais problemático do que eu pensava? Teria achado outra pessoa? 

Passei longe.

Vale ressaltar que o que Kevin me passava desde que começamos nossa relação, que depois chamou de apenas um lance, era a de que não podíamos ficar juntos apenas por conta de um mal timming, devido sua viagem. E eu acreditei, culpei o destino e me achei um azarado. Mas eu estava disposto até a esperar seu retorno. Eu estava disposto a qualquer coisa pra que desse certo.

Quanto equívoco.

Marquei com ele para nos encontrarmos no fim de semana, onde tentaria entender por que ele vinha agindo daquela maneira. Não aceitaria novamente que terminasse com pendências. Se era pra acabar, seria olhando nos olhos. Mas quando tentei marcar, foi grosso, respondendo apenas "ok" a tudo que eu dizia. Quanta hipocrisia, tratar assim alguém a quem levou pra cama e chegou até a dizer que amava (eu sempre acho um equívoco usar a palavra amor em momentos precoces, e evito usá-la. Sendo assim nunca retribuí os amores ditos. Não era o timming).

Dois dias depois de completo silêncio, ele me mandou uma mensagem dizendo que esperava que eu estivesse bem. Aproveitei a deixa pra puxar assunto, e não me respondeu mais. Tentei ligar pra ele, mas estava desligado. Naquele momento conversar era a única forma de esclarecer tudo. Eu já tinha desencanado até de encontrar, pois as grosserias tinham passado dos limites. mas foi só puxar assunto e o coração acelerou. Ele era o um. Eu tinha que espremer até o fim.

Até o fim, que se deu na manhã seguinte.

Logo que acordei, encontrei sua mensagem dizendo que era bom não conversarmos via mensagem, por que eu viajava em minhas teorias e devaneios. Não tenho sangue de barata, e respondi à altura. Que bela maturidade, travar uma batalha de textos por um app de bate papo, onde palavras leves saem ásperas e o que quer que seja dito sai na entonação da interpretação alheia. Não poupei nada, disse tudo que estava engasgado e que queria dizer no sábado, quando o encontrasse pessoalmente. Disse, por fim, numa confissão, que não estava a fim de nada pesado, e que tinha deixado isso claro, apesar de eu não ter maturidade pra entender. E eu revidei, claro, dizendo que eu realmente tinha muito a aprender sobre o mundo gay, onde palavras de amor não significavam nada.
Então veio a abordagem clássica usada por quase todos:

"Queria ser seu amigo...."

"Desculpa, mas pra ser meu amigo, é preciso ter certos pré-requisitos. Por isso tenho tão poucos."

Respondi, e desejei-lhe uma boa viagem e que encontrasse a leveza que tanto procurava. Foi de coração, acredito eu. Me deletou do facebook em seguida, respeitando meu desejo de não manter a amizade (que nunca existiu), ficando com consciência tranquila, já que eu quem não queria. Tudo na vida de Kevin era feito por obrigação, nunca por sua própria vontade. Ao menos eu devo ter lhe proporcionado o gostinho de fazer algo por si e por suas próprias decisões. No final, admitiu que não me queria mais, ao invés de culpar a viagem. Foi homem, afinal. Posso dizer com convicção que não me arrependo de nada, apesar de ter querido um final diferente, menos amargo. O sabor da decepção continha amargo. Ainda assim, valeu cada momento.
sábado, 18 de janeiro de 2014

Passado agridoce


Eu deveria ter vergonha de entrar aqui depois de passado mais de um ano sem postagem. Devia mesmo. Mas não tenho. Tenho um caso de amor e ódio com esse blog, e acredito que um dia voltarei a me dedicar a ele como antes, ou ao menos lhe darei um final decente. 

No presente momento, acho que não sou capaz nem de um, nem de outro. Apenas entro aqui com esse gosto amargo do que poderia estar escrevendo. Nesses anos que passaram, postando ou não postando, tantas coisas aconteceram. Há tanto que eu queria dizer e postar, mas não consegui. E não adianta tentar retomar o passado. 

A ultima tentativa foi frustrante. Acho também que o presente é sempre mais emergente. O final de 2013 teve um sabor especial. Teve um gostinho de esperança de que eu finalmente encontraria a felicidade em um amor. Vivi histórias que, se fosse um leitor do meu blog, duvidaria que de fato aconteceram. Mas aconteceram, de uma forma tão intensa, que olhando para trás, sinto uma mistura de felicidade e amargura. Preciso compartilhar isso aqui pra não explodir. Ano de 2013 foi um ano ruim. Não aqueles anos que dizemos que poderia ser melhor, mas foi ruim MESMO. Daqueles que você não quer mais ouvir falar quando termina e sente que não progrediu um só passo pra frente. Só queria que acabasse o mais breve possível. Aconteceu que, algumas semanas antes do temeroso fim (como já disse aqui, fins de ano me deixam mais pra baixo do que o normal) eu estava em mais um fim de semana entediante, caçando naqueles sites de putaria, quando enviei uma mensagem a mais um rapaz que faria-me as perguntas de sempre e terminaria em dois cenários possíveis: sexo fácil ou enrolação da web. Porém, quando o rapaz respondeu, percebi que ele era familiar. Mas estava diferente. Quando me enviou seu facebook, concluí que as suspeitas estavam certas. O rapaz era esse que vocês conheceram nesse post:

 http://nossolugaraosol.blogspot.com.br/2010/03/obis-rumos-que-vida-toma.html?zx=4cd16ef61543593b

 Sim, Kevin estava de volta. Pra não me complicar, fingi que não o conhecia e passamos boa parte daquela noite trocando mensagens e conversando via Watsapp (é, agora tenho mais essa ferramenta malévola graças a um Android que adquiri). Conversamos com uma afinidade assustadora e ele disse que sentia me conhecer de algum lugar. Eu, por outro lado, jamais imaginei que o reencontraria. Marcamos de nos ver no dia seguinte, que seria domingo, na Paulista, onde poderiamos ver os enfeites de natal. 

 Nos encontramos e a recepção foi ótima. Fomos até um barzinho do frei Caneca, onde nos sentamos e começamos a tomar uma bebida. Ele se lembrou do encontro na "T" de anos atrás, tendo 99% de certeza que me conhecia. Eu tinha 100% de certeza. Depois de alguns minutos, finalmente nos beijamos e foi como beijar aquele gatoto que conheci em 2007, sem tirar nem por. Era tudo um sonho, a primeira OBI que eu tinha em meus braços. Me chamou para ir a sua casa e resisti um pouco. Não queria que fosse apenas um sexo rápido e terminasse. Mas acabei indo. E claro, transamos. Foi uma ótima noite, e continuamos conversando no decorrer da semana. Porém, ele me revelou que faria uma viagem no começo do ano, e ficaria alguns meses fora do país, sem previsão de retorno. Era um sonho que ele tinha desde dez anos atrás, e não me opus. Apenas disse pra curtirmos o tempo que tinhamos sem pensar no futuro. E foi o que fizemos, ou pelo menos o que me esforcei pra fazer. Fui almoçar em seu apartamento, dormimos juntos e passamos ótimos dias. 

Mas fui notando que ele era bem triste por dentro. Havia algo naquele rapaz que o perturbava muito, um peso maior do que podia suportar. 

Um dia antes do ano novo, viajamos pra casa da minha prima na praia e passamos um dia fantástico juntos. Foi algo simples, ficamos andando na praia, com os pés na areia, mas foi algo tão intenso, eu olhava pro mar no horizonte e pensava: Finalmente encontrei aquele que procurei a vida toda. Não importa essa viagem, eu o esperarei, e viveremos essa história. Nem Hayashi nem nenhuma outra amizade poderia me impedir agora. Era eu e aquele rapaz contra o mundo e quem mais quisesse nos impedir. Não o deixaria ir novamente, escapando pelos meus dedos como da outra vez. Fomos até um morro bem alto na praia, de onde podia-se ver toda a paisagem e a muralha no horizonte no entardecer. Senti que tudo era possível. Resolvemos voltar na mesma noite, passeando de carro pela praia de São Vicente, com direito a parada em um quiosque gay e depois pelas praias de Santos. Dormi na casa dele e fui embora de manhã. 

Não passamos o fim de ano juntos por que ele teve que levar a mãe para a praia com a irmã dele. mas posso dizer que essa foi a melhor época de virada da minha vida. No fim de semana seguinte, passeamos pelo Ibirapuera e fui á casa dele. de noite, me levou de volta até minha cidade com seu carro.

E foi ai que as coisas começaram a desandar. 

Essa foi a ultima vez que eu o vi. Percebi seu afastamento pelas mensagens, que pareciam mais de amigos do que de amantes. Era como se ele quisesse que eu percebesse que era hora de deixar ir, era hora de eu aceitar que ele viajaria. Chegou a me dizer que era bom que eu me preparasse para sermos somente amigos, pois a viagem estava mais próxima, e que tínhamos apenas um lance e nada mais. O sonho desmoronava, e por mais que eu corresse atrás, sentia-o partir. Brigamos quando eu disse que estávamos nos tornando amigos ao invés de algo mais, e ele se afastou ainda mais. 

Engoli todo meu orgulho e liguei pra conversarmos, mas só vieram respostas secas ao que eu dizia. Seria uma forma de me afastar por estar de partida, ou teria sido mais uma ilusão de minha parte? um passado desenterrado que trouxe consigo esperanças demais e me encheu de falsas expectativas? Afinal, se todos os que ficam comigo acabam partindo com o tempo, por que com ele seria diferente? 

O passado é definitivamente superestimado e é um vespeiro quando colocamos a mão. Trás de volta o que foi adormecido, o que foi esquecido, e o que deveria ficar lá, silencioso. Mas não me arrependo. valeu cada momento, e cada sentelha de esperança de que podia dar certo. Talvez não tenha sido dessa vez, ou talvez tenha sido um timming ruim pela segunda vez. Agora só o tempo dirá.